Matéria divulgada pela revista Época logo após a dedicação do Templo de São Paulo

Dois rapazes de cabelo bem aparado, identificados por um crachá na imaculada camisa branca de manga curta, empunham livros com os quais todos os dias fazem catequese nas ruas, de porta em porta. Um dos volumes é a Bíblia protestante. O outro, um enigmático livro com o desenho de um anjo na capa: Moroni. A imagem inconfundível dos missionários mórmons é o máximo que a grande maioria dos brasileiros conhece desse culto. Até o dia 14 de fevereiro, no entanto, interessados em saber um pouco mais sobre a Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias, nome oficial da religião, poderão fazer visitas guiadas ao templo de São Paulo. Inaugurado em 1978, ele foi o primeiro na América Latina e será reaberto após dois anos de reforma. Depois disso, será ''dedicado'' e, como os demais templos mórmons, voltará a ser acessível apenas para iniciados.
''Esperamos receber 250 mil pessoas'', anima-se um dos líderes da igreja em São Paulo, o empresário Paulo Vicente Kretly. Ele pretende aproveitar a ocasião para desfazer alguns equívocos sobre os mórmons, alimentados em parte pelo perfil peculiar desse culto. Um livro polêmico sobre uma dissidência fundamentalista dos mórmons, lançado no ano passado, tem dado trabalho extra à comunidade nesse sentido. ''Conhecer nosso templo será não apenas um passeio diferente, mas ajudará a acabar com alguns mitos, como o de que os membros da igreja são ricos e seus rituais secretos'', alinhava Kretly.

O passeio é realmente bastante original, mas não necessariamente enterra mitos. As 118 salas que ocupam quase 5.000 metros quadrados na Zona Oeste de São Paulo são decoradas com pompa. Lustres e vitrais vieram dos Estados Unidos e da Itália, sofás foram feitos sob medida, desenhos diferentes para cada ambiente ornam sancas e carpete. À exceção de algumas salas com piso de mosaico ou de mármore, o templo é acarpetado para garantir o silêncio dos ambientes.
Não se vêem janelas e o ar-condicionado funciona a uma velocidade abaixo da normal, também para garantir a quietude do lugar. A iluminação ajuda a criar o clima propício para a experiência espiritual: vai se intensificando nos vários ambientes conforme sua proximidade com o principal, a Sala Celestial, uma representação simbólica do paraíso. Cristais incrustados no vitral dessa sala foram especialmente enviados aos EUA para ser lapidados.
A riqueza evidente no templo paulistano explica-se pela extrema organização e pelo rigor dos mórmons, ou Santos dos Últimos Dias, como preferem ser chamados. Eles são muito exigentes quanto à conduta moral de seus membros e sua participação de fato na comunidade. Por isso, embora não seja obrigatório, o dízimo de 10% dos rendimentos é pago pela grande maioria dos fiéis, o que garante à igreja recursos para erguer belos templos ao redor do mundo, financiar as missões de seus jovens e ainda promover obras sociais. Nos Estados Unidos, os mórmons são proprietários de inúmeras empresas, e não se tem notícia de escândalo financeiro que comprometa a instituição. O clero não é remunerado nem profissional - cada membro presta serviços voluntários por determinados períodos.

Enquanto as 930 capelas mórmons do Brasil podem ser freqüentadas por qualquer pessoa, os templos são reservados apenas aos iniciados, ou seja, a quem está há mais de um ano na religião. Para tanto, é preciso ser apresentado por um membro antigo e passar pela sabatina de um líder. Para entrar nas salas do imenso e silencioso labirinto, os mórmons trocam as roupas por vestes brancas, um sinal de que se despem das coisas do mundo e ficam iguais perante Deus. Lá meditam, assistem a palestras e vídeos e, principalmente, participam de cerimônias chamadas ordenanças, cujo ritual não é revelado senão aos iniciados.
''Não há segredo, mas as pessoas precisam estar preparadas para se aprofundar'', explica o juiz Flavio Cooper, outro líder dos Santos. Até 2000, o templo de São Paulo era o único no Brasil. De lá para cá, outros suntuosos prédios foram inaugurados no Recife, em Porto Alegre e Campinas. Embora sejam quase 12 milhões no mundo, os mórmons somam apenas 200 mil no Brasil, segundo o último censo do IBGE. A igreja contesta. Garante que, graças a sua agressiva estratégia de proselitismo, em oito décadas converteu 860 mil almas.

Para os mórmons, a família é sagrada e eterna. Além do casamento realizado nas capelas, incentivam o selamento, uma espécie de matrimônio para a eternidade. Também cuidam de batizar e casar, ''por procuração'', familiares mortos que porventura não tenham conhecido a religião. A fim de não deixar de fora nenhum dos finados parentes, investem em valiosas pesquisas genealógicas.
''A família é nosso maior investimento. Como mórmons, reservamos a ela uma noite da semana e outra para desfrutar apenas com o cônjuge'', explica o editor Cláudio Cuellar, de 53 anos. Ele e a esposa têm seis filhos e dois netos. Prezam tanto a família que compraram um terreno ao lado da casa para fazer uma área de recreação em que todos possam ficar juntos. ''Quando as pessoas conhecem os mórmons de perto, nos respeitam pela conduta ética.'' Além de preservar a família e a castidade, os Santos não fumam, não bebem álcool, café ou chá e usam vestes especiais brancas sob as roupas como sinal de recato, fé e proteção.
Fonte: Marcelo Spatafora/ÉPOCA

Um comentário:

Unknown disse...

gostei muito irei passa para amigos que não são da igreja